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Uma fotografia, um registro que torna presente a noção de refúgio

As imagens do corpo de um menino nas areias de uma praia que chocaram o mundoinseriu-se na categoria índice, destacou a existência de um fato fixado, podendo assim, contar história. As lentes de um fotógrafo captaram por trás da imagem do menino sírio a história de uma Guerra, de uma região, da necessidade de respeito aos Direitos Humanos e da diversidade. Tornou-se um relato/narração, um registro, documento que contém informações suficientes para que o observador compreenda a mensagem cristalizada na foto – o drama enfrentado por milhares de refugiados sírios, afegãos e iraquianos que buscam viver em alguma parte do mundo. Sob a perspectiva da história é uma composição que serve de testemunha sobre as dimensões do conflito e a falta de comprometimento com os Direitos Humanos. 

A fotografia é simplesmente uma fixação de um instante, de um acontecimento trágico, é um documento, que desencadeia um saber, uma densidade histórica. Possibilita o olhar para trás, o ir à busca da apreensão do tempo, o conhecer os malefícios de ações xenófobas e preconceituosas. Sob a perspectiva da história, o documento fotografia é fonte de informação que decodifica e contextualiza não apenas um fato/acontecimento, mas também, a dimensão social e política implícita na imagem. Apesar de a questão Oriente Médio estampada nos maiores veículos de comunicação mundo afora, seja por questões relacionadas ao terrorismo, religião ou Direitos Humanos, somente está ganhando a devida preocupação e visibilidade após a fotografia do corpo do menino na praia. A Guerra Civil Síria, que eclodiu em 2011, e a crescente ameaça do grupo extremista jihadista Estado Islâmico, que tomou parte do território sírio, trouxe para as sociedades ocidentais e muitas orientais a noção de refúgio. Segundo o Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), desde 2010, o número de refugiados no Brasil é de mais ou menos 6.492, sendo que, desses, mais de 1700 são provenientes da Síria. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR/UNHCR) e a ADUS (Instituto de Reintegração do Refugiado) afirmam que os países que recebem refugiados necessitam trabalhar em prol da promoção do bem estar dessas pessoas tanto em suas comunidades religiosas e étnicas, como nas sociedades dos países de asilo.

Documentos como a Declaração de Cartágena (1984) e o Relatório da Convenção da Organização de Unidade Africana (1974) trazem as discussões realizadas na Colômbia e Etiópia, respectivamente, sobre a questão de pessoas refugiadas, sendo que a primeira, trabalha o refúgio no continente americano, enquanto a segunda discute a questão dos refugiados africanos, mas também passa a considerar refugiado aquele que se vê obrigado a fugir de seu país por conta de ocupação externa, dominação estrangeira e/ou acontecimentos que perturbem, gravemente, a ordem pública, que é o caso dos refugiados sírios, que fugiram da guerra civil instalada desde 2011 até os dias atuais. Dados da guarda Costeira Turca afirmam que só nos primeiros cinco meses de 2015, 42 mil pessoas foram resgatadas no Mar Egeu. Na semana passada, foram mais de 2 mil. A União Européia assiste a chegada de centenas de milhares de imigrantes, alguns governos recusam veementemente a receber os refugiados, construindo barreiras de arame farpado (Hungria) e outros recebem sem saber como lidar com a situação (Itália e Grécia).

A fotografia que virou um dos assuntos mais comentados nas redes sociais e diversos veículos da imprensa nacional e internacional não versa somente sobre o falecimento de uma criança, apresentou a gravidade da situação e a necessidade de se desconstruir atitudes xenófobas e preconceituosas. Espera-se que adquira potencial transformador sobre o a condição de refugiados no mundo e símbolo de defesa dos Direitos Humanos. A condição de refúgio tornou-se presente.

*Rosana Schwartz é socióloga, historiadora e professora da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Foto: G1

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