O Supremo Tribunal Federal (STF) foi acionado para garantir o resultado de um referendo, realizado em outubro de 2010, quando a maioria da população do Acre decidiu restabelecer o fuso horário antigo do Estado, ou seja, de duas horas a menos em relação ao horário de Brasília. Um mandado de injunção, formalizado na semana passada, foi distribuído nesta segunda-feira para análise da ministra Rosa Weber.
Mandado de injunção serve para pedir a regulamentação de uma norma da Constituição, quando os poderes competentes não o fizeram, para garantir o direito de alguém prejudicado pela omissão. O mandado que está no STF visa concretizar a garantia constitucional da prevalência da soberania popular, exercida por sufrágio universal, mediante o instrumento de referendo.
O pleito é uma iniciativa dos deputados Márcio Bittar (PSDB-AC), 1º secretário da Câmara, e Flaviano Melo (PMDB-AC), autor do projeto que resultou no ato legislativo que convocou o referendo para que a população ratificasse ou rejeitasse a Lei nº 11.662, de 24 de abril de 2008, sancionada pelo então presidente Lula, oriunda de projeto de autoria do então senador Tião Viana (PT-AC), atualmente governador do Acre.
Tião Viana alterou o fuso horário do Acre para uma hora a menos em relação a Brasília sem a realização de consulta às populações interessadas e diretamente atingidas pela mudança. Ele mudou o horário a pedido de empresários donos de emissoras de televisão, que não querem ter gastos com a gravação de programas, conforme exigigência da classificação indicativa do Minsitério da Justiça.
A lei eliminou o quarto fuso horário brasileiro, compreendido pela hora de Greenwich menos cinco horas (GMT -5), cuja área territorial no Brasil engloba o estado do Acre e seis municípios do extremo ocidental do Amazonas (Boca do Acre, Envira, Guajará, Ipixuna, Eirunepé, Benjamin Constant, Atalaia do Norte e Tabatinga), passando para hora de Greenwich menos quatro horas (GMT -4). Ela também modificou o horário do oeste do estado do Pará (18 municípios) da hora de Greenwich menos quatro horas (GMT -4) para hora de Greenwich menos três horas (GMT -3).
O referendo foi realizado no Acre, em 31 de outubro de 2010, em conjunto com o segundo turno das eleições gerais, ao custo adicional de cerca de R$ 1 milhão. A maioria dos eleitores votou pelo retorno do antigo horário do Acre (GMT -5) estabelecido pelo Decreto nº 2.784, de 18 de junho de 1913. Em resposta ao questionamento “Você é a favor da recente alteração do horário legal promovida no seu estado?”, 184.478 eleitores afirmaram NÃO (56,87%) e 139.891 responderam SIM (43,13%), sendo que 1.241 eleitores deixaram seus votos em branco (0,37%) e 10.311 eleitores anularam seus votos (3,07%).
O resultado do referendo foi homologado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dois meses depois. O TSE comunicou ao Congresso Nacional o resultado do referendo para que adotasse as medidas cabíveis, mas o então presidente, senador José Sarney (PMDB-AP) consultou a Secretaria-Geral da Mesa do Senado e a Advocacia-Geral do Senado acerca da eficácia do resultado.
Sarney buscou amparo, também, na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania do Senado Federal, que teve a relatoria do senador Sérgio Petecão (PSD-AC), e concluiu pela imposição jurídica de expedição de Ato Declaratório pelo presidente da Mesa Diretora do Congresso. Mas Sarney não assinou o recomendado “ato declaratório” para que as disposições da Lei nº 11.662/2008 tivessem sua eficácia encerrada no Acre.
Prevaleceu a tese jurídica de necessidade de confecção de Projeto de Lei para dar eficácia ao referendo, surgindo, então, o Projeto de Lei do Senado nº 91/2011, de autoria de Pedro Taques (PDT-MT), apresentado para votação pelas duas casas legislativas. Após aproximadamente um ano de tramitação, o Congresso aprovou a alteração do art. 2º do Decreto nº 2.784, de 18 de junho de 1913, para restabelecer os fusos horários modificados pela Lei nº 11.662/2008 e em 30 de novembro de 2011 a Mesa da Câmara o remeteu à sanção presidencial.
A presidente Dilma Roussef, em dezembro de 2011, vetou integralmente o Projeto de Lei do Senado “por contrariedade ao interesse público”. Após diversas manifestações populares, principalmente nas redes sociais, a Presidência da República enviou ao Congresso novo projeto de lei, através da mensagem, originando Projeto de Lei da Câmara.
Na mensagem de veto, a presidente alegou que “da forma como redigido, o projeto de lei não permite a apreciação individualizada das alterações propostas aos fusos horários nos Estados do Acre, do Amazonas e do Pará, impedindo a apreciação da matéria face às realidades locais de cada um dos entes afetados”. Contudo, o projeto que tramita na Câmara é idêntico ao vetado integralmente, exceto no que diz respeito ao estado do Pará, ou seja, bastaria o veto parcial da alínea “c” para que fosse obtido o mesmo teor do novo projeto apresentado.
Desde então sucedem-se manobras protelatórias que impedem que a vontade popular prevaleça. O Projeto de Lei da Câmara foi aprovado em decisão terminativa, em 12 de junho do ano passado, mas deputados federais do PT apresentaram recurso para que o projeto fosse submetido ao plenário da Casa, impedindo assim o seu seguimento ao Senado Federal.
O senador Aníbal Diniz (PT-AC), que era suplente de Tião Viana, chegou a apresentar nova proposta de convocação de consulta popular no Acre acerca do mesmo assunto da alteração da hora legal no Acre, na esperança do resultado ser, dessa vez, favorável aos interesses do grupo que representa.
– Estão utilizando-se de artifício no melhor estilo de Hugo Chavez, na tentativa de realizar tantas consultas populares quantas forem necessárias até que o resultado pretendido pelo seu grupo político prevaleça, na defesa dos interesses que defendem – afirmam os deputados Márcio Bittar e Flaviano Melo no manado. Os dois parlamentares argumentam que o cumprimento do referendo merece decisão do STF por ausência de legislação aplicável ao caso.
Fonte: Blog do Altino